Enzo (nome fictício) é um jovem de 26 anos que trabalha há seis anos em uma grande empresa da região onde mora. Ele entrou por meio de um programa de formação profissional e, desde então, construiu sua trajetória dentro da organização.
Recentemente, em uma conversa, perguntei como ele estava no trabalho. Ele respondeu de forma hesitante: “está indo”. Em seguida, compartilhou uma insatisfação:
— Agora, a empresa só coloca mulheres nas posições.
Essa fala me chamou a atenção. A empresa onde Enzo trabalha tem, de fato, investido fortemente na promoção da carreira feminina. E foi esse comentário que me fez refletir novamente sobre a discriminação de gênero no ambiente corporativo — mas sob um novo ângulo.
Lembro que, quando comecei a me envolver com a pauta da inclusão de mulheres nas organizações, a desigualdade era tão gritante que as queixas masculinas sobre o tema me pareciam secundárias. Havia uma urgência em corrigir as distorções históricas. Mas, após anos acompanhando programas de equidade de gênero, percebo que entender as diferentes percepções também faz parte da jornada da inclusão.
A fala de Enzo não é isolada. É comum ouvir homens expressarem sentimentos semelhantes. E foi a repetição desse tipo de percepção que me fez querer compreender melhor o que está por trás dessas falas.
Um dos grandes aprendizados nessa jornada é que a complexidade da equidade de gênero vai além das políticas e práticas internas das empresas. Ela exige, antes de tudo, uma liderança disposta a escutar, acolher e transformar resistências em alianças. Isso só é possível quando estamos abertos, de fato, a ouvir.
Foi nesse contexto que encontrei um artigo muito relevante da Academy of Management Insights, intitulado:
“Homens e mulheres percebem discriminação de gênero de forma diferente”.
A pesquisa apresentada no artigo ouviu mais de 1.000 pessoas adultas nos EUA e no Canadá. O foco não foi apenas mapear a desigualdade de gênero — como tantos outros estudos que mostram a baixa presença feminina nas lideranças —, mas entender como homens e mulheres percebem a discriminação de formas distintas e quais os impactos dessas percepções no ambiente de trabalho.
E os resultados são reveladores:
- Tanto homens quanto mulheres percebem que existe discriminação de gênero em suas organizações.
- No entanto, as consequências emocionais e profissionais são distintas.
As mulheres, por exemplo, interpretam a discriminação como um reflexo de normas sociais historicamente aceitas. Quando discriminadas, sua autoconfiança é diretamente afetada, pois sentem que estão sendo julgadas por sua competência e capacidade.
Já os homens, ao perceberem que mulheres estão sendo promovidas, não têm sua autoconfiança abalada. Em vez disso, tendem a acreditar que as promoções acontecem por favorecimento institucional — uma tentativa de reparar injustiças históricas — e não por mérito das mulheres. Essa percepção acaba reproduzindo viéses inconscientes, que continuam questionando o desempenho feminino.
Apesar das diferenças, há um ponto de convergência importante:
Homens e mulheres, quando percebem discriminação, sentem seu senso de pertencimento enfraquecido. Isso afeta diretamente o engajamento e o desempenho — individual e coletivo — dentro das empresas.
Por isso, trazer esse tema à tona é urgente. Como líderes comprometidos com a diversidade e a inclusão, é fundamental que saibamos escutar, acolher diferentes perspectivas, gerenciar resistências e seguir orientando o avanço — sem perder de vista a complexidade do caminho.