As mulheres ganham menos por discriminação?
Talvez esse assunto seja ainda mais complexo do que pensamos. A discriminação pode dizer alguma coisa mais não explica tudo.
Os aspectos relacionados a desigualdade salarial entre homens e mulheres é só um dos muitos desafios relacionados a inclusão feminina no mercado de trabalho.
Nos últimos meses estive em contato com quase 150 profissionais de RH de setores diversos, perguntando se as suas empresas possuem estratégias de diversidade e inclusão ou se estão discutindo o assunto. 69% responderam que sim.
Ao serem perguntados acerca do COMO, nenhuma das iniciativas relatadas, mencionou ações relacionadas a equidade salarial.
O fato é que ela é real. Nos estudos de massa salarial que acompanhei durante a minha carreira essa disparidade sempre aparecia.
Estudos comprovam que nos diversos países as mulheres ganham menos que os homens em trabalhos iguais.
Alguns exemplos:
Na Polônia, para cada 1 dólar pago para um homem as mulheres recebem U$ 0,91 dólar.
Em Israel a diferença é de 0,81 dólar pago para as mulheres para cada 1 dólar pago e na Coreia do Sul, 0,65 dólar.
Esta situação persiste desde da década de 50 embora os contextos tenham mudado muito.
Na década de 50 nos EUA, por exemplo, pesquisas revelam que havia pouca representatividade feminina no trabalho corporativo e das que estavam, o nível de escolaridade era mais baixo que os dos homens, além disso, não havia leis que proibissem a discriminação. Agravado pela cultura sobre aptidão e papéis de gênero presente até hoje, a propósito.
De lá para cá, felizmente, avançamos muito.
O grau de escolaridade das mulheres ultrapassou o dos homens e as mulheres ocuparam cargos relevantes em todas as áreas: na política, nas ciências e na iniciativa privada. Também as leis avançaram muito em termos de direitos civis em vários países.
Se o contexto mudou, o que não mudou?
As pausas necessárias na carreira da mulher relacionadas a maternidade.
Estudos comprovam que durante a trajetória da carreira feminina este fator é o grande responsável por essa diferença salarial.
As muitas responsabilidades que vem com o casamento e a maternidade para a mulher são exaustivamente discutidas. A dupla jornada parece já ter sido normalizada e de certa forma glamourizada com os elogios de “guerreiras” enquanto mentalmente e fisicamente estamos exaustas.
Como repercussão da minha newsletter, onde falei sobre a desistência das mulheres de altos cargos de lideranças, recebi alguns e-mails com depoimentos, em um deles, a leitora me diz que:
“Temos esses casos de desistência porque a divisão de responsabilidades entre homens e mulheres não são equânimes.
Culturalmente é esperado que as mulheres cuidem da casa e filhos. Por mais que muitos homens ajudem, eles só ajudam… O ideal era que tudo fosse dividido igualmente.
Penso que, se assim fosse, menos mulheres desistiriam de suas carreiras.”
Precisamos normalizar as pausas da carreira feminina, falei também sobre isso na newsletter que tratei do efeito tesoura da carreira feminina.
O que fazer então? Levaríamos anos se apenas tentássemos educar as pessoas uma a uma sobre esses vieses.
Para sermos mais eficientes na velocidade das transformações, as corporações deveriam partir para INSTITUCIONALIZAR suas práticas. O redesenho de seus processos são mudanças sutis, baratas e com grande poder de transformação.
Segue apenas algumas sugestões possíveis:
- Em processos seletivos, fazer um shortlist de 4 candidatos sendo dois candidatos de cada gênero autodeclarado (recomendo avaliar a cada 3 meses, se os resultados da escolha predominam vieses);
- Em formulários de cadastros de processo seletivo, não perguntar o gênero nas primeiras perguntas, para evitar o auto estereótipo;
- Revisitar os processos de avaliação. Está comprovado que as avaliações anuais são mais propensas a carregar julgamento baseado em vieses. Inserir avaliações em intervalos mais frequentes olhando para os resultados de um projeto específico é mais eficiente e com menos interferências subjetivas;
- Revisitar a massa salarial com frequência e ter coragem para igualar os salários baseado em trabalho equivalentes e não por tempo de serviço;
- Rever os benefícios: licença maternidade/paternidade; creche.
Baseado na minha experiência liderando estratégias de diversidade e inclusão em organizações brasileiras e inspirada no Ted Talk da Sara Sanford (How to design gender bias out of the workplace?) e em um episódio da série EXPLICANDO no Netflix.